domingo, 19 de julho de 2009

CHAGAS, PAIXÃO E GUERRA EM MAYFAIR

Mal me recolho vem lá a alvorada, corneta-timbre-de-cravo saindo pelos potentes alto-falantes do teclado. Não passa ainda das cinco oitavas de amanhã.

Deve ser por isso que todos os militares de nossa força são moicanos, não há tempo de pentear, nem tempo nem disposição de colocar os mullets em dia. Só conseguimos levantar, vestir as justas calças brancas da farda e fazer o primeiro xixi do dia, apoiando com cuidado os colchões na cabeça para não encharcar. Na falta de penicos, utilizados agora como capacete de guerra, mandamos instalar vasos sanitários debaixo das camas; no entanto são muito pesados para tirar de lá. Grande azar daqueles que dormem em camas de baixo.

Fico com receio de fazer, mas logo me dou conta que é um sonho, tudo fica bem e sem acidentes. Enquanto seguro o colchão, percebo uma grave curvatura lombar nas costas de minha cama, acho que as molas M2 e M3 estão gravemente prejudicadas. Pela curvatura, temo ser fratura. Grave lordose, essa cama precisará de cuidados mais tarde.

Agora, no entanto, me dirijo ao jipe e levanto o assento basculante para tomar posse de minha Luger 7,65. O raso mais distante se aproxima, “usamos primeiro toda a munição do jipe, deixamos as portáteis para mais tarde!”, ao que respondo calado, “CALADO, essa é a estratégia!”. Ficar calado.

Subo no jipe e outro raso dirige com velocidade e destreza, “precisamos chegar logo à lanchonete antes que bata o sinal de recreio, caso contrário a fila será intransponível até que se esgotem os mayfairs”. Croissant, queijo cremoso e peito de peru, desjejum de patriotas.

Mas chegamos tarde, perdemos a primeira batalha. Quilômetros de filas em torno das trincheiras de mayfair. Só conseguiremos invadir com uma boa estratégia. Fico calado e faço gestos absurdos como aqueles que certamente já viu militares fazendo em filmes. Em essência, na realidade, nunca querem dizer nada, mas como seus subalternos são muito tolos para dizer que não entenderam, fingem que está claro e tomam alguma decisão em seu lugar. Dessa forma o oficial sempre se preserva: no caso de derrota, foi mal-interpretado. Em vitória, a glória. Basicamente isso é tudo que precisa se saber sobre a linguagem de sinais de todos os exércitos ocidentais, nada preocupados com a honra.

Ocidentais não têm kamikazes ou similares, não temos muita gente disposta a morrer por uma causa. Por isso somos bons no vôlei, só queremos dar um toque na bola e passá-la para frente.

O time feminino treina na quadra para um torneio iminente. Os rapazes observam a justiça dos shorts, enquanto elas não nos recepcionam, apenas bloqueiam e cortam, enquanto nós levantamos.

Já fiz os gestos e livrei toda a responsabilidade de meus atos, agora me misturo aos comuns. A fila começa a andar loucamente, tão rápido que não consigo acompanhar. Na verdade, minhas pernas que diminuem, diminuem tanto e doem, fico Helena, encaixotado quase, e me dói tentar correr. A calça suja rapidamente na água preta do chão, pisoteada, e vejo que o plano precisa ser cancelado, qualquer que seja. A fila anda, não posso arriscar vidas inocentes se teremos de qualquer forma mayfair. Justiça seja feita, mayfairs justificam mortes, mas não hoje.

Preciso trocar a farda para dar novas ordens. Dou tiros ao alto a fim de estraçalhar e espalhar a multidão, que corre como um bando de patos selvagens para mesma direção. Mais tiros, sabia que ter minha Luger seria útil.

Cai um helicóptero sobre a quadra de vôlei. O plano!, era esse o plano! Que injustiça, shorts voando, bolas de fogo arremessadas ao alto e abaixo para proteger minha cabeça. Estou sem penico.

Miriam aparece em meio a toda a fumaça e empunha um potente aspirador, vai puxando toda a fumaça e destroços. “Quero tudo isso limpo antes do sinal, mexam-se”. Lemmings organizados, formigas abelhas cupins e tudo está limpo.

Peço um mayfair, e o único olhar triste, abalado dos arredores é aquele que me atende, é aquele pelo qual me apaixono solidário. Patrícia, a mais jovem e também mais feia, foi obrigada a se tornar bela para substituir Andréa, a mais velha, vítima fatal da picada de um barbeiro.

Deixo de lado a vitória em mayfair e convido Patrícia à minha cama, ao que se nega. “Vamos ao mesmo quiroprata, e pelo que sei ela tem problemas graves”.

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